Acho que estás naqueles dias…

Quem nunca ouviu/disse essa famosa frase? Tirando a população infantil, e menção honrosa aqui para o infantil, acho que todos estamos familiarizados com esta expressão.

Por “aqueles dias” subentende-se, regra geral, a fase em que a mulher está no seu ciclo menstrual, que pode ou não ser acompanhada de mudanças físicas e comportamentais até que termine este ciclo. E infelizmente, na maior parte das vezes, esta frase vem carregada de conotação negativa.

O ciclo menstrual é resultante da ação de alguns hormônios que o corpo da mulher produz. Assim sendo, e sem querer que tirem um curso intensivo de medicina em algumas horas, é preciso entender o que são esses hormônios e o seu impacto (e consequentemente do ciclo menstrual) no nosso quotidiano.

Primeiro é necessário percebermos o conceito de hormônios

Tentando simplificar os termos da medicina, os hormônios podem ser descritos como as substâncias químicas produzidas pelas glândulas endócrinas (a pineal, o hipotálamo, a hipófise, a tireoide, ou paratireoide, as suprarrenais, o pâncreas, o ovário e o testículo) e garantem o equilíbrio do nosso organismo. Estes controlam desde o desenvolvimento das características sexuais, até ao nível de glicémia do organismo. Basicamente eles dizem ao seu corpo como respirar, crescer, beber e comer.

Como estamos no contexto do ciclo menstrual, é importante também sabermos quais os principais hormônios femininos e o seu e impacto papel para a mulher e para os que a rodeiam.

Principais hormônios femininos

  • Progesterona
    Regula os ciclos menstruais e prepara o útero para receber o óvulo fertilizado (gravidez).Caso não aconteça a fertilização, os ovários cessam a produção de progesterona, o que leva as paredes do útero a descamar (menstruação). A progesterona também é conhecida como o “hormônio da gravidez” pois está intimamente ligado à reprodução humana.
  • Estrogênio
    Existem vários tipos de estrogênio. Este é produzido nos ovários , embora em alguns casos possa ser produzido pela placenta. é o principal responsável pelas características tipicamente “femininas”, como seios maiores e quadris mais largos do que os dos homens. O estrogênio está associado à menstruação, mas também afeta várias funções corporais, incluindo o desenvolvimento ósseo e a saúde cerebral, cardíaca, vascular e do trato urinário.
  • Testosterona
    Mais abundante nos homens, este hormônio também está presente nas mulheres, contribuindo para crescimento muscular e ósseo, regular níveis de energia e libido. A produção exagerada deste hormônio em mulheres está associada ao desenvolvimento de características masculinas como voz grossa e hirsutismo (pelos faciais).

Em diferentes períodos do mês, o organismo das mulheres passa por ciclos de variações hormonais. Além de provocar efeitos no corpo, essas alterações afetam a rotina, o humor e o bem estar. Estas alterações também acontecem ao longo dos anos.

Essencialmente o ciclo menstrual é composto pelas seguintes fases com as suas características:

Fase folicular (entre 7 a 20 dias)

Nesta fase é produzido o estrogénio. Aqui o estrogênio estradiol (também conhecido com o hormônio da felicidade) estimula a disposição e o desejo sexual (libido) pois catalisa os neurotransmissores serotonina (promotora da sensação de bem estar e felicidade) e dopamina (associado a motivação e prazer)

Fase ovulatória (2 a 3 dias)

Esta é constituída pela libertação do óvulo dos ovários para ser fecundado. É no processo ovulatório que é produzida a progesterona, também conhecido como “hormônio calmante”

Fase lútea (10 a 16 dias)

Aqui a progesterona atinge o seu pico, para preparar o útero para a gravidez. Este que é um hormônio bastante benéfico pois tem as seguintes vantagens: prevenção do cancro; redução de inflamação; construção muscular; promove sono; protege contra doenças cardíacas e acalma o sistema nervoso, facilitando a gestão do stress.

Fase menstrual (3 a 10 dias)

Caso o óvulo não seja fecundado, as paredes do útero contraem e descamam para expulsar os tecidos. Nesta fase tanto o estrogênio como a progesterona estão nos seus níveis mais baixos. Consequentemente os níveis de energia da mulher também o estarão.

Bom, por esta altura, depois de tantos termos médicos, pode estar um pouco confuso, mas por favor não me abandonem. Esta parte introdutória era mesmo necessária para explicar as variações que ocorrem nos corpos e mentes da mulher no decorrer de um mês e convidar-vos, estimados leitores, a repensarmos na expressão que deu o título a este artigo.

” TPM é comum, mas não é inevitável…

Feita esta pequena digressão pelo mundo da medicina, é tempo de abordar a questão da tensão pré-menstrual (vulgo TPM). Pois é meus caros, é exatamente nesta fase (um pouco antes da menstruação) que a mulher é alvo da famigerada frase mencionada.

A TPM é comum, mas não é inevitável e até curável na nossa humilde opinião. Antes de mais, as mulheres são seres humanos e como tal merecem ter as suas emoções consideradas e não invalidadas através da classificação do seu comportamento como “hormonal” (mas isso é assunto para outro artigo) por que quer que seja. Existem uma variedade de sintomas físicos e comportamentais que podem ser usados para descrever a TPM: irritabilidade, ansiedade, depressão, sensibilidade, distúrbio de sono, retenção hídrica, inchaço, dores de cabeça, desejos alimentares, inchaço e dor nos seios, acne e etc.

Estes sintomas têm lugar devido à dança dos hormônios nesta fase (estrogênio e progesterona). Ou seja, não é “xilique”, mas sim algo físico onde a mulher pouco ou nada tem a dizer. No entanto, existem maneiras de minimizar estes efeitos e poderão ser abordadas num artigo subsequente.
Considerando que as mulheres não têm escolha sobre estes acontecimentos e que a mãe natureza tem voz de comando sobre as nossas vidas (embora nós muitas vezes lutemos contra) talvez não devêssemos exigir tanto das mulheres e muito menos diabolizar a fase pré-menstrual ou mesmo menstrual delas. Provavelmente mais empatia tanto por parte dos homens, como por parte das mulheres teriam um efeito muito mais benéfico, do que o tradicional “estás naqueles dias”.

Pode não parecer porque muitas vezes este assunto não é abordado frequentemente e com a abertura necessária na nossa sociedade, mas esta estigmatização do ciclo menstrual afeta bastante a autoestima da mulher, principalmente no que diz respeito a sua capacidade de fazer parte de uma comunidade que a aceita em todas as suas fases pois, muitas vezes, e também por causa do uso de expressões como a supramencionada, as mulheres sentem-se retraídas e inadequadas aos círculos sociais e de suporte que, por natureza são ou deveriam ser seus. É como se a sociedade gritasse na cara das mulheres, apenas tens valor se não estiveres menstruada.

É tempo de fazermos diferente e desmistificar algo tão natural e bonito como o ciclo menstrual, pois é graças a este que a mulher tem o dom da vida.

Camila Sequeira e Paco

Fundadora e autora do Naturalíssima.

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