Sono, o nosso herói adormecido

Imagine o seguinte cenário: após uma noite de sono profundo e ininterrupto, você acordar sem despertador, sentindo-se não só descansado, mas também completamente revigorado e com energia suficiente para, como diz o ditado popular, “comer a vida com uma colher grande”.

Pois é, se o(a) nosso amigo(a) leitor é como eu e acredito que 90% da população mundial, de certeza que nem consegue se recordar qual foi a última vez em que este cenário aconteceu.

O ser humano passa cerca de um terço da sua vida a dormir, ainda assim, muitos de nós negligenciamos o vital papel desta necessidade básica do reino animal. Pausa aqui para uma curiosidade: sabiam que o ser humano é um único animal que intencionalmente luta contra a necessidade de dormir? Pois é, tanto que existe até uma frase célebre difundida pela cultura de trabalho excessivo: “Vou dormir quando morrer”. Confesso que esta frase muitas vezes me faz sentir um buraco no coração por motivos que não caberiam em apenas um artigo.

Podíamos aqui iniciar a reflexão sobre os benefícios do sono, mas, confesso que acredito ser muito mais impactante e produtivo olharmos a relação e impacto que a privação do sono tem nas diversas áreas da nossa saúde física e mental. Dormir, de forma rotineira, menos de 6 horas por noite, coloca desafios que vão da esfera física e mental até a esfera social. Abaixo destacamos algumas áreas:

1. O sono e o estado emocional
Acredito que todos nós já ouvimos frases como “Perdi a cabeça” e “Acordei do lado errado da cama” ou ainda “ele/ela está assim porque não dormiu bem esta noite”. Empiricamente, todos temos a noção de que o sono tem um grande impacto no nosso estado emocional;
Estudos revelam que a privação do sono não empurra, necessariamente, o cérebro para estados negativos, mas sim tende a fazê-lo oscilar entre os extremos positivos e negativos e já sabemos que extremos geralmente não são boa notícia.

2. O sono e a capacidade de aprendizagem
Quando se compara a capacidade de aprendizagem entre indivíduos devidamente descansados e indivíduos que não dormiram na noite anterior, verifica-se um declínio de 40% da capacidade do cérebro de gravar novas memórias no último grupo. Esta pode ser a diferença entre passar ou reprovar num exame.
As memórias apreendidas enquanto privados de sono são esquecidas rapidamente nas horas seguintes, pois são frágeis.

3. O sono e o peso
Quanto menos a pessoa dorme, maior é a tendência de comer, pois vários são os fatores que contribuem para a circunferência da cintura alargada. Primeiro o sono interfere em duas hormonas que controlam a saciedade (leptina), baixando os seus níveis e a hormona responsável pela sensação de vontade de comer (grelina) aumentando-a. Este desequilíbrio leva a um aumento da quantidade de comida ingerida, que por sua vez leva ao aumento do peso.

Normalmente nestas condições o consumo de calorias ultrapassa o gasto de calorias pois quanto menos a pessoa dorme, menos energia tem para se movimentar ou praticar alguma atividade física, tornando-se mais sedentária.
Como se este cenário não fosse mau o suficiente, o sono não interfere apenas no apetite, mas também na qualidade dos alimentos que desejamos. Pessoas privadas de sono tendem a desejar mais doces, alimentos ricos em carboidratos e com mais sal.
Por fim, a privação de sono interfere diretamente nos níveis de testosterona, que impactam diretamente na construção de massa muscular e ganho de força.

4. O sono e o sistema reprodutivo
Tanto os níveis hormonais masculinos como femininos são afetados pela privação do sono. Homens que dorme poucas horas ou tem fraca qualidade de sono apresentam uma regressão de 29% na sua contagem de esperma, afectando inclusivamente a qualidade deste. A baixa de testosterona provocada pela privação do sono tem ação direta nos níveis de testosterona, baixando-os e desta forma provocando um aumento da fadiga ao longo do dia e diminuindo a claridade de pensamento e capacidade de concentração. Esta baixa também diminui o desejo sexual, comprometendo uma rotina sexual satisfatória.

Para as mulheres não é muito diferente, pois com a privação de sono há uma diminuição hormonal da fase folicular, necessárias para a concepção de um bebé. Alguns estudos também mostram que mulheres com rotinas de sono erráticas, tem 80% mais probabilidade de ter problemas com a saúde reprodutiva (fertilidade, abortos, etc).
Se estes fatores forem combinados num casal jovem da sociedade moderna que quer constituir família, não é difícil prever que a privação do sono é receita para desastre na certa, caso não exista um esforço consciente para reverter esta situação.

5. O sono e a beleza
O famoso “sono de beleza” não é mito. Este é um sono reparador e de qualidade (7 a 9 horas de sono ininterrupto e profundo). A privação do sono afeta a nossa aparência, proporcionando:

  • Palidez ou opacidade facial;
  • Acne;
  • Olheiras;
  • Secura e irritabilidade da pele;
  • Descaimento e peso das pálpebras;
  • Inchaço dos olhos;
  • Rugas e linhas de expressão;
  • Descaimento do canto dos lábios;
  • Aparência triste.

Por fim e não menos importante, gostaria de deixar convosco algumas dicas de higiene de sono:

Durante o dia:

· Sempre que possível, exponha-se a luz solar por 30 minutos pela manhã;
· Pratique exercício físico;
· Controle o consumo de cafeína, restringindo-a preferencialmente a primeira metade do dia;

Antes de dormir:

· Diminua o tempo de exposição a electrónicos entre uma a duas horas antes de dormir;
· Evite o consumo de álcool pelo menos uma hora antes de dormir;
· Desça a temperatura do quarto e mantenha-o escuro e silencioso;

Na generalidade:

· Estabeleça uma rotina de sono: durma e acorde todos os dias (incluindo finais de semana) à mesma hora;
· Limites as suas sestas ao longo do dia;
· Tenha uma dieta equilibrada
· Melhore a ventilação do seu quarto.

Com a consciência que a mudança de hábitos apresenta desafios que muitas vezes são difíceis inicialmente, gostaríamos de lembrar a comunidade naturalíssima que o importante é perseverar e que os ganhos justificam os pequenos sacrifícios.

Bons sonhos.

Camila Sequeira e Paco

Fundadora e autora do Naturalíssima.

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